De acordo com o diretor da Ciclocidade, Daniel Guth, o aumento do número de mortes é o resultado de alguns fatores combinados, como falta de fiscalização de carros e ônibus, descontinuidade das políticas cicloviárias, aumento dos limites de velocidade nas marginais e falta de campanhas de conscientização sobre direção segura, além da falta de capacitação de motoristas de ônibus e taxistas.
“O primeiro [elemento] é uma redução e o afrouxamento na fiscalização de condutores de automóveis e ônibus. A redução [do número] de multas, da fiscalização, tem impacto direto na segurança viária e, portanto, nos números que estamos vendo aí. O segundo elemento é a descontinuidade das políticas cicloviárias: falta de manutenção e de conexões e a não discussão sobre expansão cicloviária, [que] produzem também o resultado de mortes de ciclistas”, disse Guth.
Ele considerou um retrocesso a interrupção das políticas cicloviárias, que estão sendo desenvolvidas desde a década de 70. “Políticas cicloviárias salvam vidas, são fundamentais, não só para que novas pessoas passem a usar bicicleta como meio de transporte, mas para que aqueles que já circulam, circulem com conforto e segurança. A descontinuidade dessas políticas, como a gente está vendo, produz parte desse cenário catastrófico.”
Segundo Guth, a descontinuidade das políticas parte de uma posição oficial da prefeitura, que afirma que não colocará “nenhum centavo de recursos públicos para expansão cicloviária”. Para Guth, Isso está claro no plano de metas apresentado na semana passada: “na rubrica sobre aumento de uso de bicicleta na cidade não tem nenhum recurso associado. Os únicos recursos que estão lá são privados, relativos ao programa de bicicletas compartilhadas”.
O diretor da Ciclocidade disse que o aumento dos limites de velocidade nas marginais teve efeito negativo sobre os motoristas. “Isso reverbera para a cidade toda, não só pela importância dessas vias [marginais] para a cidade de São Paulo, mas também porque motoristas que circulam por elas, circulam na cidade toda. [Isso] induz motoristas às altas velocidades, a um comportamento nocivo relativo à condução.”
Guth destacou que campanhas de comunicação sobre convívio, respeito, redução de velocidade e prioridade de pedestres, ciclistas e transporte público coletivo podem ajudar na educação no trânsito e, consequentemente, na redução do número de mortes. Ele lembrou que a prefeitura não tem produzido nenhuma política nesse sentido e criticou o slogan do prefeito João Doria – Acelera, São Paulo. “O slogan induz condutores de automóveis às altas velocidades, para acelerar, para ter um comportamento de ronco de motor, é uma lógica bastante perversa.”
Guth citou ainda a necessidade de capacitação dos motoristas que operam algum sistema de transporte público na cidade – ônibus e táxis ou qualquer outro que venha a ser regulamentado pela prefeitura. “A ausência de treinamento e capacitação vinculados a alvarás ou a licenças de operação por parte de concessionárias, por exemplo, também produz um trânsito muito mais agressivo, muito mais violento.” Além disso, muitas vezes, os motoristas de ônibus não estão preparados para conduzir um veículo tão grande, causando pelo menos um terço das mortes de ciclistas na cidade, ressaltou.
Nota da prefeitura
Procurada pela Agência Brasil, a prefeitura disse, em nota, que os números oficiais da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET), que levam em consideração as análises de boletins de ocorrência, ainda não foram divulgados.
“Com relação à segurança no trânsito, a SMT [Secretaria Municipal de Transportes] adotou uma série de medidas, tais como o programa Pedestre Seguro, que busca ampliar em no mínimo 20% o tempo de travessia; o 100% Pedestre, que intensificou a fiscalização e orientação nas faixas de pedestres”, diz a nota. Segundo o texto, a SMT iniciou um estudo de revisão das ciclovias para corrigir falhas e “aumentar a segurança de quem pedala pelas ruas da cidade”.
De acordo com a prefeitura, a diretriz da atual gestão é dar “a máxima utilidade às ciclovias existentes, constituir parcerias para a expansão da rede atual e, eventualmente, com amplo diálogo com comunidade e ciclistas, analisar situações pontuais”.
Camila Boehm – Repórter da Agência Brasil
Edição: Nádia Franco